Do perfume fortuito
De manhã – num daqueles dia em que se acorda sem se estar preparado – ainda a mastigar os flocos e com pingos de água na cara, pôs um pouco de perfume e penteou o cabelo da melhor forma que podia, isto é, conforme a mala e o casaco mal vestido o deixaram. Saiu de casa a correr, pois o tempo, que já escasseava, costuma ser dinheiro.
À mesma hora, ela dava os últimos retoques de uma maquilhagem leve. Pôs um pouco do seu perfume também. Quanto ao pequeno-almoço, «há um cafezinho lá mesmo ao pé do trabalho» pensou, justificando o desleixo; um queque e um galão, ou talvez um sumo, depende.
Cigarro nos queixos, braço levantado, sorriso cativante. Aí estava o autocarro. Ele entrou, passou o passe no “revisor autómato”, e sentou-se.
Ela vinha de comboio para a cidade, morava a duas estações do centro, mas era muito para vir noutro transporte qualquer; o passe era mais barato e tudo. Entrou no comboio, encontrou um espaço onde podia sentar-se a ler o último romance de um seu escritor fetiche e deu um pequeno arroto a fome.
Chegaram ao mesmo terminal, não à mesma hora, mas a segundos de um encontro fortuito. Ele do autocarro, ela do comboio. Desceram para o metro, pela mesma escada, a degraus de distância. Tão perto e tão longe. Escusado será ilustrar a protocolar entrada no metro, mais vale que ela fale por si: pessoas, pisões, cotoveladas, águas-de-colónia, hálitos, risos e constrangimentos.
Por incrível que pareça, e como se este texto não o fizesse já adivinhar, entraram na mesma porta e, ele agarrado ao varão, veio ela encostar os cabelos lisos, e de um castanho caramelo, à sua mão.
– Desculpe, desculpe – dizia ela, quase envergonhada. – Não foi minha intenção!
– Mas, não há mal nenhum – as faces ruborizaram. – A minha mão já aí estava, não me importa e, para ser franco, gostei de sentir o seu cabelo a tocar-me nas mãos. – Disse, num acesso de atrevimento, muito vermelho, como se estivesse a rebentar de gozo. Depois caiu em si.
Continua…
$BlogItemCommentCount$>Inventaram o Amor:
continua rapidamente, espero...é que isto não se faz, interromper uma história que mal começou. Vá, ponha-se mas é a escrever :)
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